sábado, 2 de junho de 2012

OLHAR AS CAPAS


Obras Poéticas

Manuel Bandeira
Prefácio de Henrique Galvão
Editorial Minerva, Lisboa, Junho 1956

Poética

Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expe-
    diente protocolo e manifestações de apreço ao Sr. diretor.

Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicio-
    nário o cunho vernáculo de um vocábulo.

Abaixo os puristas

Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis

Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de
    si mesmo

De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante
    exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes
    maneiras de agradar às mulheres, etc

Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbedos
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare

— Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.

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