terça-feira, 16 de junho de 2015

DEMASIADO MORTAL


O Robert estava a celebrar o seu quadragésimo primeiro aniversário no loft da rua 23, apenas a dois quarteirões do Chelsea, com champanhe, caviar e orquídeas brancas. Nessa manhã sentei-me à escrivaninha do Hotel Mayflower e escrevi-lhe a canção «Wild Leaves», mas não lha dei. Embora estivesse a tentar escrever para ele uma letra imortal, tudo aquilo me parecia demasiado mortal.
Alguns dias depois, o Robert fotografou-me vestida com o blusão de aviador do Fred para a capa do nosso projectado single, «People Have the Power». Quando o Fred olhou para a fotografia, disse «Não sei como ele faz isso, mas todas as fotografias que faz de ti ficam parecidas com ele.»
O Robert queria muito fazer um retrato da nossa família. Na tarde em que chegámos ele estava bem vestido e gracioso, embora saísse muitas vezes da sala, dominado por ataques de náuseas. Eu olhava-o sem poder fazer nada enquanto ele, sempre estóico, minimizava o seu sofrimento.
Tirou apenas meia dúzia de fotografias, mas como já se sabia ele nunca precisava mais do que isso. Animados retratos do Jackson, do Fred, e dele comigo, de nós os quatro, e depois mesmo antes de nos irmos embora, ele deteve-nos. «Espera aí. Deixa-me fazer uma de ti e da Jesse.»
Peguei na Jesse ao colo, e esta esticou-se para ele, a sorrir. «Patti», disse-me ele, premindo o obturador. «Ela é perfeita.»
Foi a nossa última fotografia.

Patti Smith em ApenasMiúdos

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