domingo, 6 de setembro de 2015

A MESA DE TRABALHO DE MIGUÉIS


Gosto de cartas.

Sou um fã de correspondência trocada entre gente da cultura.

Já por aqui tenho pegado na Correspondência que José Rodrigues Miguéis e José Saramago mantiveram enquanto Saramago esteve à frente da editora Estúdios Cor.

A fotografia acima, mostra a mesa de trabalho de José Rodrigues Miguéis, tal como se encontrava no dia em que faleceu.

Olha-se a cadeira e vemo-la amarrada com cordas.

Numa carta a Saramago, datada de Abril de 1965, Miguéis escreve:


Não tenho condições, para tudo resumir na essência.

Más condições de trabalho que, mesmo assim, não impediram Miguéis de escrever as páginas maravilhosas que se encontram espalhadas pelos seus livros.

Exilados como Miguéis e Jorge de Sena viveram tempos dramáticos e em que todo o tostão era poupado, nunca esbanjado.

Em Portugal estar ausente é estar esquecido e morto, escreveu Miguéis

Numa carta, datada de 15 de Março de 1967, Miguéis diz a Saramago:

Escrevo-lhe só por isto: mandei-lhe ontem, registado, o meu volume da Léah com as correcções: por via marítima, porque o aéreo custava um olho! Vai chegar daqui a um mês ou mais.

Uma outra, datada de 24 de Fevereiro de 1970:

Preparava-me para bater esta carta (tinha o rascunho feito) quando me chega a sua de 20, com o cheque de 500 escuod ($17,42): Obrigado – contem comigo – devolvo recibo. (Não telegrafo porque já mandei dois tel. Estes dias, e custam de 3 a 5 dlrs.!) E agora, o que dizia o rascunho:
Perdoe-me se o tom da m/ última carta lhe pareceu cortante: pense na minha situação de expatriado, solitário, privado na n/ gente e da n/ terra, velho e adoentado, sobrecarregado de problemas insolúveis ( quantos mais anos pensa V: que eu vou viver?) – e dependente exclusivamente do
pipe-line ou cordão umbilical que através da COR e do jornal me prende aí. O meu coração começa a  dar sérios sinais de fadiga ou protesto…


Legenda: fotografia tirada do Catálogo da Exposição comemorativa do centenário do nascimento de Miguéis, 

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