segunda-feira, 13 de junho de 2016

NÃO SEI SE OS ASTROS MANDAM NESTE MUNDO


Não sei se os astros mandam neste mundo,
Nem se as cartas —
As de jogar ou as do Tarot —
Podem revelar qualquer coisa.

Não sei se deitando dados
Se chega a qualquer conclusão.
Mas também não sei
Se vivendo como o comum dos homens
Se atinge qualquer coisa.

Sim, não sei
Se hei-de acreditar neste sol de todos os dias,
Cuja autenticidade ninguém me garante.
Ou se não será melhor, por melhor ou por mais cómodo,
Acreditar em qualquer outro sol —
Outro que ilumine até de noite. —
Qualquer profundidade luminosa das coisas
De que não percebo nada...

Por enquanto
(Vamos devagar)
Por enquanto
Tenho o corrimão da escada absolutamente seguro.
Seguro com a mão —
O corrimão que me não pertence
E apoiado ao qual ascendo...
Sim... Ascendo
Ascendo até isto:
Não sei se os astros mandam neste mundo...


Richard Zenith na Fotobiografia de Fernando Pessoa escreve:

Pessoa, de certo modo, acreditava em tudo, mas sem ter fé em nada. Isso é, estava aberto a tudo, absorvia tudo para depois fazer o seu próprio percurso.

Richard Zenith diz que, com este poema,  escrito a 5 de Janeiro de 1935, devemos estar atentos à atitude religiosa de Pessoa.

Legenda: Fernando Pessoa nas notas de cem escudos, impressas nos anos 80.

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