segunda-feira, 3 de outubro de 2016

UM POETA VISCERAL


Eduardo Guerra Carneiro.

Não raro me lembro do Eduardo e sempre que isso acontece, coloco poema ou prosa.
Conheci o Eduardo através de um livrinho de capa vermelha, editado, em Janeiro de 1970 pela Ulmeiro, a que deu o título de Isto Anda Tudo Ligado que é o 1º volume dos Cadernos Peninsulares.

Custou-me 25 escudos, tal como a lápis o livreiro escreveu na página de abertura.

O título do livro forneceu frase que muita e variada gente cita amiúde.

Grande parte dessa gente nunca passou os olhos pelo miolo.

Percorro livre o livro.
Não tenho cartilha. Bebo as letras.
Risco o livro. Leio em voz alta.
Liberto-me do livro e livre
atravesso as ruas. Mas ao livro
regresso e nele me deito.
A ternura das páginas íntimas.
O esboço de outro livro. Nos livros
soletro o que neles não está.

Uma manhã, em conversa com Vitor Silva Tavares no subterrâneo 3, perguntei se o Eduardo deixara espólio.

Não me respondeu…

Constatei que a conversa lhe trazia uma certa tristeza.
Não insisti.

De mim para mim, concluí que esse espólio se encontra perdido, ou em mãos vampirescas à espera de uma qualquer volta de negócio.

Agora, à procura de uma outra coisa na colecção da revista  &etc , no seu nº 9 de 15 de Maio de 1973, na página 2, na secção «Alguns de Nós», encontrei  o que do Eduardo disseram:

O Eduardo nasceu em Chaves, em 42. Depois foi à vida: perdeu-se um vossa excelência (4º ano incompletíssimo de história), ganhou-se um poeta: «O Perfil da Estátua» (pata uma colecção – Silex – dirigida pelo Casimiro de Brito), 1961; «Corpo Terra», (edição de autor, 500 exemplares, 400 na tipografia), 1965; «Alguma Palavras» (col. Nova Realidade), 1969; «Isto Anda Tudo ligado= col. Cadernos Peninsulares), 1970, e, já na rua ed. Assírio & Alvim), «É Assim Que se Faz a História».
Livros, amores, deambulações, vagabundagens, cervejolas, empregos vários, carolices (o & etc agradece, no que lhe toca): uma generosidade (arrebatada, lírica, desmedida) que lhe alimenta a poesia (dor mais funda, alegria em sol maior) e lhe dá cabo da gravata.
Assim o Eduardo é um poeta visceral. Talvez que já não saiba (nem possa) ser outra coisa. Amen. 

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