domingo, 8 de janeiro de 2017

POVO QUE CANTA


Há 88 anos nascia em Ajaccio, na Córsega, Michel Giacometti.

Um dia, conheceu em França uma portuguesa com quem acabou por casar.

Vieram passar a lua-de-mel a Portugal e o etnomusicólogo corso acabou, também, por se apaixonar pela terra, pelo canto do povo.


Deixou dito que no Alentejo existia um gosto pelo canto, único no mundo.

Esse canto, em 27 de Novembro de 2014, haveria de tornar-se Património Cultural Imaterial da Humanidade.

Percorreu o país-de-lés, tendo deixado a maior recolha jamais feita em Portugal sobre música popular e tradicional.


O programa Povo Que Canta, título retirado de uma canção anarquista espanhola - «Pueblo que canta no puede morir» -, transmitido na televisão a preto e branco, foi publicado em DVD pelo jornal Público.


 Em Agosto de 1979, encontrou-se, em Albufeira, com Miguel Torga, encontro que o escritor assim regista no seu Diário:


Não sei que vento o trouxe de terras estranhas. Sei que há muito aportou aqui e que, afortunadamente, criou raízes. Como que a dar-lhes alimento, estuda as várias manifestações da nossa cultura popular, desde a música às danças, aos adágios, à culinária, às próprias mezinhas com que nos curamos. Foi desses tesouros – alguns definitivamente salvos pelo seu carinho – que, de resto, falámos largo tempo, ele a discretear e eu a sentir, emocionado, que tinha diante de mim um livro aberto da pátria. O café era uma Babel. Idiomas de todos os continentes cruzavam-se em todas as direcções. E, na minha aflição nativa, nada me podia dar mais consolo do que encontrar um paroxismo de lusitanidade naquela natureza em boa hora transplantada. Tive a impressão súbita que o Algarve voltava a ser português.

Legenda: murais, em Peroguarda, homenageando Michel Giacometti.

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