quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

MÁRIO-GIN-TONIC


Já há muito que deixei de encontrar na rua o Mário-Henrique Leiria.

Sei que, neste Portugal que tanto se orgulha de ser ceeeuropeu, morreu de fome, sim de fome, a 9 de Janeiro de 1980.

Mas não se trata disso agora, antes da falta que ele me continua a fazer.

Pensei que rodeado dos seus livros não seria atingido pela sua morte.

Nada mais estúpido e imprudente.

Porque os livros, sim os livros estão ali, mas o que eu sinto é a falta da indefinível e enorme ternura deste velho, amante, como ninguém, de gin-tonic.

Os seus risos sarcásticos, as suas gargalhadas sempre prontas a ferroar a canalhada camaleona pela qual tinha um enorme desprezo.

Eh pá!, nóas antes tínhamos um inimigo pela frente. E sabáimos e eestávamos todos realmente unidos, eu queria lá saber que cor de camisa é que tu vestias, ou que cor de cuecas é que aquele usava, éramos todos antifascistas, e pumba. Agora pá, o Álvaro Guerra deixou de me falar, porque eu não pertenço ao clube dele…

Que dirias tu, destes políticos de pacotilha, da enorme manada de corruptos que nos assiste, destes doutores e engenheiros da mula ruça, uma gentalha que nos inferniza os dias, sem qualquer fim à vista?

Volta e meia lá vou ao British-Bar beber três gins: um por ti, outro por mim e one for the road, assim um pouco como em O Imenso Adeus do Chandler, traduzido por ti, como mais ninguém o poderia traduzir.

Um velho cheio de caracter, um enfant terrible que deixou um pungente sabor de saudade instransponível.

Frequentava, e desenvolvia, o fascínio da amizade, do companheirismo, um humor finíssimo, também uma maldade biliosa para quem lhe pisava os calos.

Mas um tipo de uma ternura desconcertante.

Já gostava de gin-tonic, quando, na redacção do República, o conheci.

Mas posso afirmar que tudo passou a ter um outro sabor, um outro encantamento, uma outra paixão.

Vá lá a gente saber porquê!...

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